
A Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) condenou o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ao pagamento de pensão por morte a uma mulher que, mesmo após o divórcio, voltou a conviver em união estável com o ex-marido. A decisão reformou sentença anterior que havia negado o benefício.
Apelação Cível nº 5002022-79.2023.4.03.6123.
Protocolo do CNJ foi fundamental para revisão da sentença
O colegiado considerou, como ponto central do julgamento, o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, instituído pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O documento orienta magistrados a evitar perguntas baseadas em estereótipos ou em aspectos irrelevantes, priorizando critérios para o reconhecimento da união estável, como convivência pública, contínua e duradoura, além da dependência econômica.
De acordo com o voto da relatora, desembargadora federal Gabriela Araújo, houve falhas na condução do depoimento da viúva. Foram feitas perguntas de cunho íntimo e discriminatório, como os motivos do divórcio e da reconciliação, se havia violência doméstica, se o casal dormia no mesmo quarto, se mantinha vida sexual ativa e se havia traições por parte do falecido.
“Tais questionamentos reiterados traduzem uma visão extremamente estigmatizante com relação ao papel e aos direitos da mulher dentro de uma relação conjugal”, destacou a magistrada. “Práticas eivadas de machismo afrontam o caráter protetivo do benefício previdenciário e desvirtuam a real finalidade do processo.”
Reconhecimento do cuidado como expressão de afeto
O acórdão também cita a Lei nº 15.069/2024, que instituiu a Política Nacional de Cuidados, ao reforçar que o cuidado prestado pela mulher ao companheiro enfermo é um fator que deve ser valorizado para caracterizar a relação afetiva.
“Admitir que a mulher assuma uma função não remunerada de cuidar de seu companheiro enfermo e ao mesmo tempo afirmar que tal responsabilidade não é suficiente para configurar a relação afetiva entre o casal acaba por reforçar esse estereótipo de gênero extremamente discriminatório”, pontuou a relatora.
União estável reconhecida e pensão concedida
O casal, que teve duas filhas, divorciou-se em 2017, mas retomou a convivência em regime de união estável até o falecimento do segurado, em setembro de 2020, em decorrência de câncer. Com a decisão da Décima Turma, a pensão por morte será paga de forma vitalícia à viúva, a partir da data do falecimento
Fonte: Previdenciarista